imagem: Edward Hopper: Freight car at Truro/1931
Pesadas como ossos atrelados
às carruagens do universo,
as minhas pálpebras silvam
contra as desmentidas claridades.
Se ao menos um cavalo de espigas
corresse nos campos de granito.
Adormecem nos carris as ávidas
giestas dos meus olhos,
ao invés dos apeadeiros.
Longe lamentam-se os rebanhos,
rondando rosas e cisternas
riscadas de cor lentíssima.
O exílio de ver-te em fuga pelas
fronteiras fere-me no horizonte
da hospitalidade dos teus alvéolos.
Se ao menos experimentasse
escadas entre os escombros.
Um eco de visão transporta-me
ao centro dos amarelos cascos
desta fome de falcão que, no alto
da cal, cabisbaixo, te contempla.
Se ao menos um girassol de sangue
alvorecesse nas ervas estelares.
às carruagens do universo,
as minhas pálpebras silvam
contra as desmentidas claridades.
Se ao menos um cavalo de espigas
corresse nos campos de granito.
Adormecem nos carris as ávidas
giestas dos meus olhos,
ao invés dos apeadeiros.
Longe lamentam-se os rebanhos,
rondando rosas e cisternas
riscadas de cor lentíssima.
O exílio de ver-te em fuga pelas
fronteiras fere-me no horizonte
da hospitalidade dos teus alvéolos.
Se ao menos experimentasse
escadas entre os escombros.
Um eco de visão transporta-me
ao centro dos amarelos cascos
desta fome de falcão que, no alto
da cal, cabisbaixo, te contempla.
Se ao menos um girassol de sangue
alvorecesse nas ervas estelares.
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luís filipe pereira
20 comentários:
Filipe, meu querido amigo
sua poesia revigora os sentidos. Aqui leio o poema todo um lamento feito de imagens rápidas. Um grito abafado como desfecho nos dois últimos versos.
Mas essa imagem corta como faca e é brilhante:
"Se ao menos um cavalo de espigas
corresse nos campos de granito."
Grande abraço, admiração e saudade sempre. Fabrícia Muniz
cara Poeta Fabrícia Muniz, querida amiga,
muito obrigado pelas palavras generosas com que brinda a minha poesia e, sobremaneira, pela leitura/interpretação tão enobrecedora deste poema que, a se, é também como diz "todo um lamento feito de imagens rápidas", a sugerir, ouso acrescentar, o descarrilamento, a insânia de rectas que jamais se juntam.
Muito grato.
minha admiração, minha saudade e amizade: sempre.
filipe
a tantos níveis considero sublime este seu poema: a incoactiva originalidade da pro-vocatória reinvenção do axioma da geometria euclideana a titular o poema; o desamparo que a metáfora maior das rectas/carris exponenciam (e que bem escolheu a imagem de E. Hopper, pintor sobermo da irrevogável solidão/desamparo de ser(mos), o extraordinário fulgor imagético da sua poesia, destaco, acme metafórico, "girassóis de sangue". Tão seu este seu poema e, por isso mesmo, sempre assombroso e mágico. Parabéns!
Joana Dias
Filipe, meu querido amigo
A tua poesia é deveras apaixonante, interessante e saciável, como mostra as tuas palavras enigmáticas, doces e bonitas.
primeiro estou sem palavras, pois venero as tuas auto-escritas, também te venero, pois não é qualquer pessoa que escreve como tu, sensível e delicado, como está evidenciado no mesmo...
Ás vezes não há explicação para tanta coisa inexplicável mas és um devorador de palavras, isto é, tu interiorizas e escreves o que te vem à mente e isso é bom, soltas todo o teu estado de espiríto na escrita.
quero deixar aqui a minha notificação em como passei aqui e deixei-a.
Mais uma vez estou estupefacto com as tuas palavras e quero dizer te que sinto me bem quando leio-os
Grande abraço, admiração, ternura e afecto, pois pessoas como tu não se encontram todos os dias :)
bonito, sem palabras
os versos correm paralelos num eterno desencontro como "carris" sem "horizonte", e as palavras como "carruagens" sem "apeadeiros" encontram o sentido axiomático na tua poesia imagética, criadora, inovadora. Consequentemente deslumbrante. rui
Caro Daniel nascimento, eis-me grato pela generosidade das tuas palavras sobre a minha escrita; Caríssima J. Dias, muito obrigado pelas linhas hermenêuticas que avança e que tanto enriquecem este meu poema, Caro Rui Cecílio eis-me muito grato por sempre visitares este meu espaço, sempre enriquecendo-o com as tuas palavras interpreativas e generosas.
Bem hajam.
filipe
Caro Filipe,
Um belo, sensível e inteligente poema, a acrescer a todo um trabalho que tem vindo a desenvolver e que tenho acompanhado com muito interesse, respeito e prazer.
Um abraço,
A l e p h
Caro Poeta "aleph" (...)que muitíssimo admiro, eis-me muito grato pelas suas palavras e, sobremaneira, muito contente por continuar a acompanhar a minha escrita. Bem haja.
Filipe
há poemas que nos tocam assim, dando-nos a ver, pelo poder que a sua palavra poética intimamente transporta, e fazendo-nos pensar: sua poesia dá a ver, dá a pensar, alastra sentidos e dimensões. Que pedir mais a um grande poeta cuja voz vai ganhando modulações de enorme maturidade, fulgor criativo, de raríssima beleza e sapiência. É um privilégio lê-lo.Tornou-se-me essencial visitar, revisitar este blog que sempre se pauta pela qualidade, bom gosto e exímia poesia.
M. J. Fernandes
Também a sua poesia, caro Filipe, é como que "riscada de cor lentíssima" por isso a ela apetece sempre voltar e demorar nos "apeadeiros" de extraordinários versos.
J. Morais
Meu Querido Amigo,
Rios de poesia, rios de beleza!
Como ficaria bem numa galeria com Blaise Cendrars, René Char, Yves Bonnefoy e André Breton!
Há tanto mouvement nas pinceladas que cada poema acrescenta essa Tela que cada vez está mais bela, mais completa, mais profunda!
Como o poeta Ramos Rosa estará orgulhoso de ter escolhido a sua poesia para o seu Mestrado.
Tanta grandeza, tanta humildade!
E, cada vez mais, criando a sua própria identidade, a sua poesia, e... les mots toujours les mots!
Tal como o Ródano aceitando os vários afluentes que o enriquecem mas não se misturando com nenhum!
Maria Saturnino (Sani)
caríssimos intertextuantes, cara Maria saturnino, querida amiga Sani, fico sempre muito muito grato com a generosidade das suas palavras. bem haja.
luís f. pereira
Dois pontos definem uma recta.
......
Duas rectas que se cruzam,
Eis um ponto.
Esse ponto, em movimento,
Há-de ser recta também.
Hão-de formar outro ponto,
Novo ponto, nova recta,
E sempre assim, sem remédio.
Reinaldo Ferreira
Poeta Moçambicano
...... ... ... ...
Professor,
Meu Amigo,
Entre os meus tempos livres (poucos) leio e releio e então me enleio nos seus poemas.
Há sempre algo novo que na leitura anterior não apreendi, há sempre uma palavra que me leva a outro poeta, à recordação de uma emoção, de um som, de um perfume.
E, de palavra em palavra, de verso em verso, vou navegando.
Neste país onde se valoriza tanto o futebol e tão pouco os poetas, quero partilhar consigo um poeta grande entre os grandes que Portugal desconhece - Reinaldo Ferreira.
Até Setembro,
Com amizade
Sani
meu amigo,
"são rosas", as palavras do poema, povoadas de seres e nomes de histórias simultaneamente "eus" e "outras".
entra em movimento um pêndulo que deambula entre o emaranhado de sentimentos e a estranha visitação das coisas simples - as mais profundas, por sinal -, passando por uma densa fronteira entre a palavra e o referente, estabelecida por uma espécie de fenomenologia dos lugares (des)povoados.
Perante este lugar de poesia "as minhas pálpebras silvam / contra as desmentidas claridades" e eu afasto-me, para dedilhar, com maior clareza, o corpo sinuoso do poema.
obrigada.
grande beijinho amigo,
bri
Caríssima escritora Maria Saturnino, querida amiga Sani: muito obrigado pela generosidade das suas palavras e, sobremaneira, por me oferendar a partilha de um poeta que, lamentavelmente, desconhecia. Muito obrigado por o ter trazido a este espaço de intertextualidades.
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Queida Amiga Bri,
Eis-me grato (muitíssimo) pela tua, ela sim, - e sabes o quanto a admiro, genuinamente - prodigiosa hermenêutica deste meu poema que, sem dúvida, fica agora, com as tuas palavras, com a força exegética das tuas palavras, que sempre vão dento, que sempre insinuam o miolo dos textos, que fica agora muito mais rico.
A minha amizade e admiração, sempre.
grato,
filipe
Um Poema com a sua voz ímpar, inconfundível, para mim - e um dia sê-lo-à para muitos e muitos - indispensável.
Grato caro poeta L. F. Pereira
Axioma 2: "Se ao menos experimentasse
escadas entre os escombros".
É exactamente esse o axioma do poeta quando assiste ao frenesim das chamas que devoram a sua poesia e o elevam a poema! Serei eu capaz? Será esse é o meu frenesim Dionisíaco? a metáfora da verdade a elevar a vida do poeta a poema?
Congratulo-me muito pela sua visita ao meu deliriospoeticos.blogspot.com e aqui retribuo.
Na verdade tal como o Luís, sou licenciado em Filosofia e professor... às vezes da difícil arte da sabedoria. Parabéns pelas metáforas, algumas são semáforos vermelhos ou verdes. Com toda a consideração...
Eu outra vez para dizer: Grande, Grande, Grande este poema... muito para além da (às vezes tonta filosofia). Lê-se como quem cresce lentificadamente para aprender muito depois...
Caro escritor & Professor José Miguel Oliveira, saiba que será sempre muito bem-vindo a este espaço. Grato pela visita e pelo comentário.
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