quarta-feira, 30 de julho de 2008

ANA HATERLY, série 1999: O Pavão Negro & poema da poeta-pintora & UMA GLOSA (minha) d'O Pavão Negro

"O pavão negro da escrita
abre um leque de opções
exibe o luxo
do seu traje-cárcere
Babel silente
no vazio da página
prende o tumulto da voz
fixa o assalto da mão
Última instância rebelde
é jogo
luta
luto
grito calado"
Ana Hatherly,O Pavão Negro, Assírio & Alvim, 2003, 19
_______________________________________________________________
O pavão traça-se______________
escurece o inumerável grito no obscuro esgar de cada grafia
crescem nas líquidas caudas manchas melodiosas
como se fossem fatias do ensombrado canto do sol
a mão acompanha a mancha de tinta musical
que o tempo virá esclarecer nas elegias que na tela esvoaçam
e fazem da página da alma uma discordante demonstração
do sismo
do susto
do silêncio
dos agudos leques mastigando a mão até à língua misteriosa dos olhos
o pavão traça-se____________________
é uma imagem que se abre sobrevoando no grito a garganta inclinada
para o mágico pavão num instante de negro
para a mancha a sabotar o poema porque prévia ao signo
o pavão traça-se__________________
e no bando pousado na boca dos negros nomes sacode-se
a solitude da pele sobre o papel do pavão sobre a pele
dos espaçamentos
das entranhas
o pavão traça-se_________________________
transviado engole na mão as asas do espaço sobre a escrita-tinta.
luís filipe pereira
_____________________________________________________________
Ana Haterly/Pavão Negro (1999)

9 comentários:

Anónimo disse...

o pavão traça-se na página ou na tela, para que no ritmo de palavras ou de formas se entrelace a musicalidade do enamoramento. rui

Anónimo disse...

traça o rumo do pavão com a tinta que te corre nas veias
deixa que o teu peito aberto lhe sirva de tinteiro
bico tisnado pelo tempo que te asperge
aceita a inevitabilidade das suas folhas, leque de cauda
[voz de todos]
Infinito universo de possibilidades
Negro de tinta, matiz de alma

Victor Banza

luís filipe pereira disse...

Victor, é lindo o teu texto poemático- Obrigado. Reitero: estas intertextualidades crescem e reverdecem com o leque das tuas exímias palavras. Palavras arrancadas, como as penas leves da linguagem, do corpo da alma onde negra irrompe a tinta em águas de clara e vibrante nomeação.Diz Ramos Rosas, num seu prefácio ao livro A Imobilidade fulgurante: "o poeta é um ser com e para os outros": essa é a força motriz, que tão bem expandes, deste blog intertextualístico- com um abraço poético:filipe

MóniKa disse...

Feliz encontro do poeta com as palavras sopradas pela alma.
Saudações Poéticas

Anónimo disse...

Excepcional Intertextualidade! O seu poema é fabuloso. A mão traçando o pavão traçando-se e sente~se, prodigiosamente e em voo, a "escrita-tinta".........

Anónimo disse...

a fisicalidade da escrita tendo como eixo a metonímia da mão escrevente é extraordinária. Ana Haterly gostaria muito, por certo, de conhecer o seu poema que tão originalmente captura o voo, as pinceladas esvoaçantes da séria visual e poética do Pavão Negro. Parabéns, filipe.
J. morais

Anónimo disse...

Oi, Luís,

obrigada pela leitura e meus parabéns pelo seu blog e excelente currículo!

vi que você gosta de fotos em preto e branco.

mando uma que ganhei ainda ontem (ou anteontem), que tem a cor das folhas de amendoeira sobre o céu cinza do Rio de Janeiro: parece tratamento de imagem, mas a foto é autêntica, não há tratamento algum.

Mais tarde vou te ler com calma.

Um beijo,
Paula Cajaty

Anónimo disse...

Fabuloso. Parabéns.
V. Vares

Anónimo disse...

QUE POEMA FABULOSO! ESPANTOSA FORÇA CRIATIVA.LINDO; PARABÉNS. QUANDO, QUANDO O SEU LIVRO DE POESIA?SEI QUE ESTÀ PARA BREVE E TARDA O BREVE....