segunda-feira, 12 de maio de 2008

11 de maio de 2008 ou na resssaca de uma tarde prodigiosa: lançamento de As Vindimas da Noite

museu nacional de arqueologia. visíveis os vestígios. a filigrana dos gestos. os trilhos e as luminárias das vésperas redivivas. ânforas e diademas de silêncio. vasos de sede voltados para o tejo. mapas de singrar no tempo. moinhos de singrar no espaço em rotações remotas e deflagrantes. uma sala com a nobreza das nebulosas e do cinzel. com a dignidade ígnea das esquadrias afáveis (contra a retumbância da solidão dos barcos amurados na cidade) como manchas de elipses. ecoa a música e a memória feliz expande-se, andamento a andamento, pela luz fluvial debruçada no ciclorama das janelas. o piano e o violoncelo remam com o saxofone em duas canções de F. Sor. a guitarra de Ricardo Barceló estende a esteira do instante ao canto de José Corvelo. Na capa de Júlio Cunha do livro de Maria do Sameiro Barroso - As Vindimas da Noite - adormece um rosto que sonha socalcos de afecto ou vindimas entre as palavras e a penumbra de júbilo dos violinos. as pálpebras cerradas numa refulgência de portos escutam melhor os estuários calorosos do vinho derramado (são secretos corredores estróficos). o sonho crepita. a cal floresce. apresento o livro através de uma tetralogia de socalcos. a voz desmuralhada de Isabel Wolmar apanha os bagos dispondo-os na mesa comunial da poesia. o mar entra no tejo tingido do vinho ou os versos encontram o mar no seu bramir de bagos. de barcos. de brisa. os moinhos dançam (uma valsa de versos encontrados). o museu está vivo. (ouve-se o rumor secreto do ouro). o museu cada vez mais arqueológico. cada vez mais vivo alçado na festa dos poemas. no vocabulário dos encontros como uma vagens de búzios. assim foram as «palavras acesas»: "As vinhas eram rios vermelhos que, na louca/respiração da chama, ascendiam. /Nos jardins de absinto, a música ecoava, /em paraísos doces" (in As Vindimas da noite, p. 43). estavam descerradas as pálpebras do rosto sobre a capa. despertaram com(também os nossos e de todos quantos lerão este precioso livro de Maria do Sameiro Barroso) "os olhos acesos da segunda lua".........
(dedico este trecho ao Editor da Labirinto, João Artur Pinto: por permitir
os cursos das tábuas de mundo da poesia (por me ter convidado para o Conselho Editorial da Labirinto); à Maria do Sameiro: pelos aromas da amizade e pelos caminhos de neblina da sua belíssima poesia; ao Dr. Luís Raposo: por acolher a poesia num espaço nobilitante: aos presentes e futuros leitores do livro As Vindimas da Noite que abriga um meu posfácio)..............................
Luís filipe Pereira

5 comentários:

Anónimo disse...

Que grande escritor. Que texto!Que maravilha!impressionante qualidade. Quando o livro, mas o seu livro?Um mágico da palavra sem ilusionismos. Apenas literatura (da mais impressionante que tenho lido). POr que esperam as editoras? Editores e críticos: leiam estes textos. Leiam este texto.
G. Morais

MóniKa disse...

A convite do autor do posfácio, Luís Filipe Pereira, tive o prazer de assistir à apresentação do livro “As Vindimas da Noite” (editora Labirinto) de Maria Sameiro Barroso, que teve lugar no Museu Nacional de Arqueologia.

A inebriante apresentação da obra, a cargo do escritor e crítico literário Luís Filipe Pereira, foi precedida por um momento musical, do qual destaco “Valsa” do Ballet Cendrillon e Las Quejas de Maruja (José Corvelo – Canto e Ricardo Barceló – Guitarra Romântica).

De realçar ainda a leitura sentida de alguns poemas pela actriz Isabel Wolmar.

Respirei e senti poesia. Obrigada.

Anónimo disse...

Infelizmente não me foi possível assistir ao lançamento do Livro de Maria do Sameiro Barroso, mas obrigado Filipe pela extraordinária capacidade da sua linguagem em fazer-nos palpar a atmosfera.Entramos no espaço e queremos ficar sem tempo no seu relato a saborear o seu (raro, raríssimo)vigor poético.A autora do livro, que lerei com o maior interesse, deve estar feliz por ter um leitor-intérprete (grande escritor sei que é) tão exigente sagaz e generoso como o Filipe.
L. R. dos Santos

Anónimo disse...

Caro Luis Filipe,

Depois de ler o seu perfil no Blog, só me resta levantar a taça e saudá-lo.
Maria Saturnino

À toi,
Qui as du temps le sens et la mesure
En buvant la vie en grosses gorgées
Et talonnes avec effronterie
Allure, charme et flaterie
De l’amour ne donnant qu’un tantet
Que tu tires à coups perdus
Heurté, sans remords, contre les rives !

À toi,
Que suis de la marée le fluxe et le reflux
En profitant de la vie le plaisir et le luxe
Entassant tes succès en remous
Ravi, comme si tu recevais la barrette
Sans avoir cinglure par tes conquêtes
Avec tes cheveux aux vents du Sud
Souhaitant aussi les vents du Nord

À toi,
Cavalier errant,
Qui déjà hausses tes épaules mécréantes
Qui du monde connais les monts et les vaux
Et la vie t’a donné du vrai et faux
Et a fait danser la valse et le rigodon
Échouer et déraidir tes soupçons
Ignorant les ravages du temps !

À toi
Mon Prince,
Contre vents et marées, je lève ma tasse
Et te salue !
Maria Saturnino

Anónimo disse...

Contra Ventos e marés - isso mesmo-
este texto é de tal modo impressionante que nem ventos e marés derrubarão a sua força, a sua
excelência literária.
M. R. de Almeida